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terça-feira, 6 de setembro de 2011

Notas sobre uma experiência etnográfica: Juventudes, estilos de vida e os usos dos lugares no Bairro Siqueira Campos

Este texto é sobre a possibilidade de pensar os métodos e as técnicas da pesquisa etnográfica, como também uma reflexão sobre o “campo” para a Antropologia. Tomo aqui como referência os métodos e as técnicas de pesquisa aplicadas em minha proposta de pesquisa para a Dissertação de Mestrado em Antropologia. Desde o segundo semestre de 2009, sou estudante do NPPA/UFS. Quando surgiram as primeiras ideias para a realização de um trabalho etnográfico, eu tinha muitas intuições e, também, muitas dúvidas. Devido à minha formação em História, estava muito ligado a questões historiográficas. Mas, como todo estudante-pesquisador ao “iniciar-se” numa dada área do conhecimento, precisava passar por este “rito de passagem”. Assim, fiz várias incursões às bibliotecas e fui mantendo contato com uma ampla bibliografia sobre juventudes, culturas juvenis, estilos de vida, processos de identificação e os usos dos lugares de lazer e sociabilidades. Dessa forma, fui aos poucos estranhando o universo cotidiano e sociocultural ao qual estava aparentemente inserido. Além de perceber, também, os aspectos da análise antropológica.

Desde 1991, sou morador do Bairro Siqueira Campos, em Aracaju, estado de Sergipe, Brasil. Este bairro é um dos maiores de Aracaju, além de ser um grande polo comercial e de consumo cultural. Atualmente, na Praça Dom José Thomaz, a única do Siqueira Campos, há uma grande concentração e circulação de jovens que se movimentam pelas ruas, bares-lanchonetes, lanchonetes e equipamentos urbanos a procura de lazer e entretenimento e, tem esta praça, como espaço central no bairro, como um espaço âncora de identificações e sociabilidades, o lugar praticado, onde as juventudes e seus estilos de vida demarcam, de modo relativamente estável, lugares como “territórios de subjetivação” e redes de solidariedade.

Geralmente, é na Praça Dom José Thomaz onde encontro os amigos, jogo basquete e compartilho dos serviços públicos de transportes. No entanto, até ingressar no Mestrado em Antropologia Social, nunca tinha problematizado tais orientações. A partir de uma bibliografia especializada sobre os estudos culturais, juventudes e os estilos de vida, ao qual fui mantendo contato aos poucos, percebi que nunca estive inserido nessas redes de socialização e comecei a estranhar o que até então me era aparentemente familiar. De fato, seria praticamente impossível estabelecer laços com todos os indivíduos e lugares com os quais cruzamos no dia a dia de uma cidade, ou mesmo, nos bairros onde moramos.

Passei, então, a caminhar e a analisar os processos de identificação e diferenciação realizados pelos jovens nos usos dos lugares de lazer e sociabilidades no Bairro Siqueira Campos, a partir de construtos de estilos de vida associados à música, o que implicou a investigação sobre as práticas e o consumo de determinados bens ligados às culturas juvenis. Passei a perceber inclusive, a circulação de indivíduos de várias procedências da cidade, como alguns grupos de jovens que são reconhecidos na região como “pagodeiros”, como a “galera do rock”, a “galera do hip hop” e a “galera do reggae”. Em todos os casos os grupos são identificados por bens ligados aos estilos musicais e as culturas juvenis.

Para tal análise, me cerquei de diferentes processos metodológicos, mas como um exercício intelectual de atravessamento e distanciamento, já que o universo pesquisado compõe meu mapa político e sociocultural cotidiano. A partir do contato com as reflexões do antropólogo Gilberto Velho (1979), insisti na ideia do autor de reconhecer as diferenças e estranhar o que está próximo. Enveredei por problematizar as vivências e as relações afetivas com o campo de estudo, o “estar lá”. Velho publicou diversos textos nos quais descreveu como viviam os moradores das camadas médias em um prédio de apartamentos do tipo conjugado, no bairro histórico de Copacabana, no qual residiu nos anos setenta do século vinte: o cotidiano, seus estilos de vida, o consumo e o porquê as pessoas moravam e valorizavam este bairro. Ao fazer a “observação participante” e problematizar o que aparentemente lhe era familiar, o autor, portanto, abriu margens e contribuiu significativamente para o desenvolvimento do método da “distância social” e “distância psicológica”: a trajetória antropológica de transformar o “exótico em familiar” e o “familiar em exótico”.

Ao seguir este prisma, passei a caminhar, a observar e a me relacionar de forma mais crítica com as pessoas, com os lugares de lazer, entretenimento e as sociabilidades da população jovem no Siqueira Campos. Essa perspectiva do caminhar, como diz Certeau, leva ao pesquisador a perceber como “[...] O cotidiano se inventa com mil maneiras de caça não autorizada” (1994, p. 38). Nesse sentido, os lugares são concebidos e metaforizados no caminhar dos seus agentes, e carregados por uma polissemia de sentidos. São os gestos, os hábitos de comer e beber, as gestualidades corporais, as práticas, os conflitos, os signos, as “artes de fazer” (CERTEAU, 1994) e as narrativas do cotidiano, cuja tessitura constitui o “uso da tática dos usuários” (Idem) para qualificar o espaço como um lugar de conhecimento, mas, sobretudo, de reconhecimento dos grupos. Neste caso, os da população jovem e os seus estilos de vida.

Nesta pesquisa, fiz mais que caminhar pelos lugares e conversar com as pessoas. A tentativa foi de uma “descrição densa”, o mapeamento da paisagem incorpórea do objeto pesquisado (GEERTZ, 1978). Como diz Geertz, à prática da etnografia não é somente estabelecer relações com o objeto de análise, mas manter um diário de campo, selecionar informantes, ir a lugares e voltar deles com informações; é observar os sistemas de símbolos em seus próprios termos e descortinar toda a trama social. Dessa forma, adotei alguns balizamentos e estratégias metodológicas, que permitiram uma melhor compreensão do objeto de estudo: levantamento bibliográfico, fontes documentais, entrevistas, observação participante e as caminhadas sistemáticas pela paisagem urbana dos lugares investigados.

Sendo assim, dividi a proposta de Dissertação em três capítulos: No primeiro, Espaços de lazer e sociabilidades da juventude no Bairro Siqueira Campos: lugares e estilos de vida; a ideia foi de traçar um panorama sobre a relação entre a cidade, o Bairro Siqueira Campos e a população jovem. A discussão gira em torno de descrever o território, as representações sobre o lugar, os espaços de lazer, as vivências e as sociabilidades no cotidiano do bairro ao longo do século vinte, fazendo conexões com a presença das juventudes. A análise contempla as narrativas produzidas pela imprensa e os intelectuais sergipanos, além das entrevistas com antigos moradores. Ainda nesse capítulo, dedico-me a descrever as transformações no cotidiano do Siqueira Campos, os lugares de lazer, as juventudes, as vivências e os estilos de vida, a partir da estratégia das caminhadas sistemáticas pela materialidade da paisagem e de entrevistas com os jovens praticantes desses espaços.

O segundo capítulo, O cotidiano, os usos e os discursos das juventudes sobre os lugares; paira sobre dois grandes eixos: no primeiro, faço incursões etnográficas sobre os usos dos espaços de lazer e sociabilidades, e as juventudes praticantes destes espaços. No segundo eixo, analiso os discursos, os usos, as práticas e os bens culturais que caracteriza essa população jovem e seus estilos de vida. Nesse sentido, estabeleço a discussão sobre a categoria “circuito” (MAGNANI, 2002) como conceito analítico, salientando a sua importância na análise do significado e da experiência proporcionada pelos jovens mediados pelas ações simbólicas. Evidencio os gostos culturais, os “grupos sociais de afinidades” e os estilos de vida presentes no Bairro Siqueira Campos.

No terceiro capítulo, Processos identitários juvenis no Bairro Siqueira Campos, busco a partir das reflexões de Gilberto Velho (1979, 2007, 2008) e da observação participante, manter um contato e uma vivência durante um período de tempo mais longo com o objeto de estudo, pois certos aspectos de uma cultura e de uma sociedade só emergem a superfície com um esforço maior, mais detalhado e aprofundado de observação e empatia. Analiso os estilos de vida, as tensões entre os “grupos sociais de afinidades”, as práticas, o consumo e as experiências particulares realizadas nos usos dos espaços de lazer e sociabilidades no âmbito do Bairro Siqueira Campos. Dessa maneira desenvolvo o argumento central desta Dissertação, a saber: os processos identitários juvenis como construtos de estilos de vida distintos, realizados nos usos dos lugares de lazer e sociabilidades no Bairro Siqueira Campos, ao incorporar situações singulares imediatamente reconhecíveis no cotidiano deste bairro. Evidencio ainda, quatro grupos juvenis distintos que são reconhecidos no Siqueira Campos como “pagodeiros”, a “galera do rock”, a “galera do hip hop” e a “galera do reggae”. Busco compreender como cada um dos grupos percebe os “outros” e como veem a “si mesmos”, além de analisar como eles se caracterizam e se relacionam com os espaços de lazer e sociabilidades no bairro, imprimindo um sentido aos lugares.

Referências

CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano: artes de fazer. 11 ed. Tradução de Ephraim Ferreira Alves. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. v 1.

GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.

MAGNANI, José Guilherme Cantor. “Os circuitos dos jovens urbanos”. In: Tempo Social, revista de sociologia da USP, v. 17, n. 2, 2005, pp. 173-205. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v17n2/a08v17n2.pdf.

PAIS, José Machado. Culturas Juvenis. Edição: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2003.

VELHO, Gilberto (Org.). Rio de Janeiro: cultura, política e conflito. Rio de Janeiro, RJ: Zahar, 2008.

________________. A utopia urbana: um estudo de antropologia social. 6. ed. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2002.

________________. Antropologia urbana: cultura e sociedade no Brasil e em Portugal. 3. ed. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar, 2006.

________________. Desvio e divergência: uma crítica da patologia social. 3. ed. Rio de Janeiro, RJ: Zahar, 1979.

________________. Individualismo e cultura: notas para uma antropologia da sociedade contemporânea. 8. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.

terça-feira, 10 de maio de 2011

“PUXO O CAVAQUINHO PRA CANTAR DE GALO”: ESTILO DE VIDA, CONFLITO E SOLIDARIEDADE NO CIRCUITO DO CHORO DE ARACAJU.

(por Daniela Moura Bezerra)

A proposta do presente texto é a de apresentar brevemente os encaminhamentos adotados para a elaboração de minha Dissertação de Mestrado em Sociologia (em andamento), um trabalho que tem dado continuidade as discussões apresentadas na monografia de conclusão de curso em Ciências Sociais, no ano de 2008.

Em linhas gerais, o objetivo é o de estudar a presença e a consolidação do estilo musical conhecido por choro, na cidade de Aracaju/ SE. Segundo Fortuna (1998), a abordagem sonora da cidade, sendo a música apenas um desses sons, representa uma faceta que permite conhecer e entender as trajetórias, configurações sociais, os estilos de vida e as formas de estrutura social. A idéia defendida aqui é a de que a prática do choro – seja por tocá-lo ou por freqüentar os locais em que este pode ser ouvido – acaba por definir um estilo de vida com padrões particulares na cidade. Conforme argumenta Featherstone (1995), os estilos de vida representam as disposições, práticas culturais e formas de lazer que possibilitam a demarcação de fronteiras entre grupos. Tais fronteiras são estabelecidas principalmente pelo acúmulo de prestígio e de critérios legitimadores em um dado campo social. Os estilos de vida, portanto, podem servir de demarcadores espaciais das cidades, que são entendidos neste caso como circuitos. Utilizo tal categoria para descrever e analisar os usos que um determinado grupo faz do espaço urbano (MAGNANI, 1999).

O circuito aracajuano do choro é composto atualmente por sete grupos, que se reúnem em bares, restaurantes e residências, localizados em diferentes pontos da cidade. A estratégia adotada para a identificação desses conjuntos foi a de utilizar as indicações dos próprios participantes para encontrá-los, o que além de indicar os espaços, revelou a existência de rivalidades no circuito, tendo em vista que o fato de não mencionarem outros grupos não se devia ao não conhecimento dos mesmos, mas sim a falta de afinidade, quer musical, quer afetiva entre eles. Deste modo, é possível afirmar que tal circuito encontra-se fragmentado e no conflito os grupos reivindicam para si o título de “verdadeira boemia aracajuana”.

Entender quais são os critérios ativados ao se tomar o próprio choro enquanto estilo de vida constitui, deste modo, o cerne do trabalho. A análise das entrevistas revelou na tentativa de legitimação cada grupo destaca ou ativa uma particularidade, tais como: ser um virtuoso (músico excepcional), ser o grupo mais antigo, promover constantemente eventos relacionados ao choro, ser o grupo mais atuante, entre outras. Estes são considerados nesse universo musical critérios legítimos. Contudo, a maneira que o circuito está organizado dá indicações da existência de outros recursos, talvez até de maior peso nesse processo, perceber quais são estes é o que se propõe a pesquisa.

O desenvolvimento metodológico do trabalho acorreu em algumas etapas. Após a identificação do atual circuito, foi feito um levantamento a respeito do que se tem escrito a respeito do choro. Foram lidas reportagens de revistas especializadas e jornais locais, livros que contam a história do estilo musical no Brasil e trabalhos acadêmicos referente ao mesmo. Também foram revistos os vídeos, anotações de campo e transcrições feitas no desenvolvimento do trabalho de monografia. Por fim, foi realizada a observação de campo que consistiu em frequentar os locais produtores do choro em Aracaju.

A proposta de Dissertação está estruturada em três capítulos, o primeiro, intitulado Por uma sociologia da música: as representações do choro no cenário musical brasileiro, inicialmente situa a proposta metodológica do presente trabalho. Em seguida, apresentamos o que para fins de análise classificamos de “histórias oficiais” sobre o gênero no país e com o intuito de se perceber de que maneira as narrativas, a respeito do seu desenvolvimento no Brasil, têm servido como uma estratégia de legitimação na escolha do ouvir e do executar o choro. Também discutimos o papel da Rádio Aperipê na sustentação e manutenção do estilo musical e a criação do Projeto Cidade do Chorinho, pelo governo estadual.

No segundo capítulo, Discursos e práticas de diferença e identificação no circuito do choro de Aracaju, apresentamos como o choro tem se constituído em um estilo de vida, pois acreditamos que esse tipo de música tem desempenhado um papel central na vida do grupos estudados. Posteriormente, analisaremos os discursos e práticas de diferença e identificação que compõem o circuito do choro e que têm contribuído para o surgimento de ralações de rivalidade e solidariedade entre os grupos. O último tópico apresenta um estudo comparativo entre as rodas de choro e casas de serestas encontradas no Bairro Industrial da cidade. Para isso, buscamos perceber se a diferenciação entre os estilos é uma questão de técnica musical ou de contexto social.

No terceiro e último capítulo, A busca por legitimidade no contexto das rodas de choro da cidade, fazemos um estudo sobre os trajetos dos músicos no circuito, ou seja, das escolhas feitas por estes no circuito. A idéia defendida aqui é de que essas escolhas em muito dependem de suas histórias de vida e que, por sua vez, conferem prestígio ou não a eles. Também serão abordadas as retóricas identitárias que constroem a figura do ser chorão em Aracaju.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FEATHERSTONE, Mike; SIMÕES, Julio Assis (Trad.). Cultura de consumo e pós modernismo. São Paulo: Studio Nobel, 1995
FORTUNA, Carlos. Imagens da cidade: sobre a heurística das paisagens sonoras e ambiente sociais urbanos. Coimbra: Centro de Estudos Sociais, Nº 104, 1998.
MAGNANI, Jose Guilherme Cantor. Mystica urbe: um estudo antropológico sobre o circuito neo -esotérico na cidade. São Paulo: Estudo Nobel, 1999.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Produção, Consumo e Estilo de vida: o Rock e o Sertão em Sergipe


O presente texto irá tratar de alguns pontos referentes ao meu projeto de pesquisa aprovado para o Mestrado de Antropologia Social – UFS. O trabalho intitulado “Produção, consumo e estilo de vida: o Rock e o Sertão em Sergipe”, tem como referencial teórico os Estudos Culturais, estudos da juventude, do estilo de vida e do consumo. Nesse contexto, tenho como objeto de pesquisa o evento Rock Sertão, que acontece no município sergipano de Nossa Senhora da Glória (Situada no sertão sergipano a 126km da capital e com 30.466habitantes, segundo dados do censo de 2008 do IBGE) desde o ano de 2001 e que no de 2011 está em sua 9ª edição.


A partir de pesquisa feita no Blog - www.rocksertao.com.br/blog/ - idealizado pela comissão organizadora do evento, obtive conhecimento de que festival Rock Sertão surgiu a partir da necessidade dos integrantes de uma banda de rock local, chamada Fator RH, em divulgar seu trabalho e promover um intercâmbio entre as bandas que se intitulam alternativas (termo para designar grupos à margem do circuito midiático) e independentes (termo usado para designar bandas sem vínculo com gravadoras renomadas) para que elas também pudessem ter um espaço para demonstrar suas músicas.


De acordo com os idealizadores, a idéia pensada para o festival era a de que as bandas alternativas de vários estilos musicais pudessem demonstrar suas produções, sem cobrar cachê, num evento que ocorreria em praça pública para que assim se pudesse formar um público maior para esse estilo musical e atender os anseios do público local. Além disso, buscava-se também através do festival o acesso a uma produção musical oriunda da própria região e o estimulo ao surgimento de novas bandas de rock, contrapondo-se aos estilos musicais mais evidenciados pelas propagandas de governo em Sergipe e pela mídia comercial, como: o forró, o pagode e o axé.


O festival, ao longo de sua trajetória, foi sendo ampliado e tem conseguindo espaço de divulgação local através de um programa que vai ao ar aos domingos na Rádio Comunitária “Boca da Mata FM” e que toca diversas músicas do cenário do rock independente sergipano. Através do festival, o público pode também comprar materiais das bandas, como CD’s, camisetas, adesivos e conhecendo melhor a produção das bandas.

O público e a participação no evento foram se ampliando. As pessoas começaram a ligar para a rádio Boca da Mata e pedir que tocassem as músicas das bandas que participavam do evento, fato que propiciou a organização decidir quais bandas poderiam tocar e agradar o público local. Dessa maneira, eles foram atraindo cada vez mais público, até que na 6ª edição chegaram a participar 16 bandas sergipanas e um cantor de reconhecimento nacional: Zeca Baleiro. A partir dessa aceitação local, o festival foi também chamando atenção da mídia sergipana, tendo sua programação divulgada na maior emissora de TV sergipana, vinhetas divulgadas nas rádios, divulgação na internet e em blogs, além de na penúltima e última edição contar com o apoio do poder público estadual para a realização do festival.
Dito isto, o objetivo geral da pesquisa é analisar a partir do festival Rock Sertão, o consumo cultural e estilos de vida dos jovens produtores e consumidores do festival e sua relação com o que este evento significa em Sergipe.


Como metodologia da pesquisa, proponho contextualizar a trajetória do surgimento do festival, como ele se firmou, como é financiado, como é caracterizado e produzido, através de entrevistas com os produtores do evento. Estou acompanhando, através da observação direta, toda a logística dos dias que antecedem o festival deste ano, e estarei presente nos dias de realização do evento. Etnografar o momento do festival, analisando os atores presentes (produtores, músicos e consumidores), como agem, como se movimentam, como se vestem, suas percepções sobre o evento, suas relações de sociabilidade, usos dos espaços, apropriações simbólicas e expressões que aproximam a análise sobre o consumo do festival, bem como sobre um estilo de vida próprio. Além disso, a idéia é entrevistar atores do setor midiático municipal e estadual a fim de entender suas percepções sobre o festival e como ele se situa diante do contexto do mainstream cultural sergipano.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

JUVENTUDE E ESTILOS DE VIDA: OS USOS DOS LUGARES DE LAZER E SOCIABILIDADES NO BAIRRO SIQUEIRA CAMPOS

Por Mateus Antonio de Almeida Neto

No presente texto, eu tentarei estruturar algumas informações sobre minha pesquisa de mestrado em Antropologia Social (UFS), que versa sobre a juventude num bairro de Aracaju, estado de Sergipe, Brasil.. O problema de pesquisa gira em torno dos usos dos lugares de lazer e sociabilidades, onde jovens realizam processos de identificação e construtos de estilos de vida em territorialidades que se conflituam no espaço público da rua. Meu objetivo é analisar os processos identitários juvenis praticados nos usos dos lugares de lazer e sociabilidades no bairro Siqueira Campos. Nesse sentido, de forma mais operacional, delimitei a pesquisa a partir quatro estilos de vida juvenis distintos presentes no bairro: galera do "heavy metal", do "hip hop", do "reggae", e, principalmente, dos jovens que se identificam como do "pagode baiano". Tenta-se perceber as tensões, os gostos, as formas de lazer e o consumo cultural entre estes estilos de vida no uso desses espaços.

Localizado na zona oeste da cidade de Aracaju, “porta de entrada e saída da capital sergipana”, o bairro Siqueira Campos no final do século passado, aos poucos, tornou-se um grande pólo comercial. Hoje à área do bairro é recortada por vários estabelecimentos comerciais. A partir daí, constata-se pelos dados demográficos a diminuição de uma população permanente. No entanto, ao seguir a estratégia das caminhadas pela materialidade do lugar, nota-se um relativo aumento de uma população flutuante a procura das mercadorias, dos equipamentos urbanos e do consumo cultural ofertados nos estabelecimentos comerciais, de lazer e entretenimento, funcionando como ponto de referência para um número mais diversificado de freqüentadores ao permitir a circulação de indivíduos de várias procedências e estilos de vida juvenis distintos.

O referencial teórico que utilizo dialoga com os estudos sobre a temática das culturas juvenis, dos usos dos espaços de lazer e sociabilidades, do cotidiano, dos estilos de vida e das identidades culturais. Segundo Pais (2003, p. 70), as culturas juvenis têm que ser entendidas a partir de seus contextos vivenciais, cotidianos, “[...] isto é, no curso das suas interações, que os jovens constroem formas sociais de compreensão e entendimento que se articulam com formas específicas de consciência, de pensamento, de percepção e acção”.

Os estudos sobre os estilos de vida e das identidades culturais juvenis apontam que os contatos socioculturais, nesse sentido, supõem proponentes de uma cultura de consumo que se configuram a partir de símbolos, elementos culturais, como: vestuário, cortes de cabelo, gostos musicais, formas de lazer envolvendo grupos de amigos e territorialidades efêmeras, que denotam certas sensações constantes de segurança ontológica entre os praticantes nos usos desses espaços. (FEATHERSTONE, 1995).

Divido o trabalho em três capítulos. Inicialmente, no primeiro capítulo, Espaços de lazer e
sociabilidades no bairro Siqueira Campos: lugares e estilos de vida
; dedico-me a traçar um panorama sobre o bairro. A análise se dá a partir da descrição do território, dos espaços de lazer, das vivências e das sociabilidades no cotidiano do bairro a partir de uma estratégia metodológica que implica caminhadas sistemáticas pela paisagem.

O percurso teórico utilizado no segundo capítulo, O cotidiano, os usos e os discursos da juventude sobre os lugares, paira sobre dois grandes eixos da antropologia: os usos dos espaços de lazer e sociabilidades cotidianas, e os processos identitários juvenis, como construtos de estilos de vida. Em relação ao primeiro eixo, procuro evidenciar os discursos sobre os usos e as práticas que caracterizam a cultura juvenil nesses espaços. Estabeleço a discussão sobre a categoria circuito como conceito analítico, salientando a sua importância na análise do significado e da experiência proporcionada pelos jovens e seus processos de identificação mediados pelas ações simbólicas. Pretendo, com isto, evidenciar os gostos, o consumo cultural, os grupos e as territorialidades no bairro.

No terceiro e último capítulo, intitulado, Processos identitários juvenis no Bairro Siqueira Campos, busco a partir das reflexões de Gilberto Velho (1979), pôr-me no lugar do “outro”, observando seus estilos de vida, as tensões entre os grupos identitários, o consumo e as experiências particulares realizadas nos espaços de lazer e sociabilidades no âmbito do bairro. Como diz o autor, trata-se de transformar o familiar em exótico e estranhar o que está próximo, pois o que encontramos pode ser familiar, mas não necessariamente conhecido, e o que não vemos e encontramos pode ser exótico, mas, até certo ponto, conhecido.

Essa parte do trabalho dedica-se a perceber e analisar os processos identitários dos jovens nos usos dos lugares de lazer e sociabilidades no Bairro Siqueira Campos. Trata-se de evidenciar, primordialmente, quatro grupos juvenis de estilos de vida distintos: a galera do heavy metal, do hip hop, do reggae e principalmente os pagodeiros. Nesse sentido, busco compreender como cada um dos grupos percebe os “outros” e como vêem a “si” mesmos, além de analisar como eles se caracterizam e como se relacionam com os espaços de lazer e sociabilidades no bairro, imprimindo um sentido aos territórios.

Referências bibliográficas

FEATHERSTONE, Mike. Cultura de Consumo e Pós-modernismo. São Paulo, Studio Nobel, 1995.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2006.
MAGNANI, José Guilherme Cantor. “Os circuitos dos jovens urbanos”. In: Tempo Social, revista de sociologia da USP, v. 17, n. 2, 2005, pp. 173-205. Disponível em:http://www.scielo.br/pdf/ts/v17n2/a08v17n2.pdf.
PAIS, José Machado. Culturas Juvenis. Edição: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 2003.
VELHO, Gilberto. Desvio e divergência: uma crítica da patologia social. 3. ed. Rio de Janeiro, RJ: Zahar, 1979.

terça-feira, 19 de abril de 2011

PRATICANTES DO URBANO: ESTÉTICA E ÉTICA DE UM ESTILO DE VIDA MARGINAL

(Por Williams Souza Silva)

A perspectiva que situa o presente trabalho toma o espaço como um lugar carregado de sentido identitário e/ou histórico, atribuído por seus usuários. “O espaço é um lugar praticado. Assim a rua geometricamente definida por um urbanismo é transformada em espaço pelos pedestres” (DE CERTEAU, 2005). Ou seja, quando um lugar se transforma em espaço para uma “tribo urbana”, significa dizer que os indivíduos desta compartilham um sentimento de pertença para com o mesmo, elegendo-o como um traço especializado capaz de dá sentido as ações e fortalecer a solidariedade entre seus membros.
Como se dá o processo de construção, ou negociação, de um Estilo de Vida underground (marginal) a partir de uma Estética e de uma Ética partilhada por um grupo determinado de freqüentadores noturnos do centro de Aracaju, associada a uma forma peculiar de praticar as espacialidades da cidade, é o interesse da dissertação que estou desenvolvendo.
Embora o universo de interesse gire em torno de questões de identidade/identificação, solidariedade/sociabilidade na legitimação de estilos de vida (ética e estética) de microgrupos, a estruturação da abordagem em torno das espacialidades das cidades se torna necessário por serem estes “lugares de convivialidade” (MAFFESOLI, 2006), onde interagem grupos sociais distintos, com seus espaços fixos e móveis, sazonais e permanentes. Este tipo de abordagem permite demonstrar as especificidades dos estilos de vida, de acordo com os trajetos praticados por tribos urbanas no mapa sócio-geográfico da cidade contemporânea. Além disso, como bem argumenta Almeida (2003, 19), essas “novas formas de experiência espacial constituem um dos principais desafios para as Ciências Sociais na contemporaneidade”.
Entendemos que os usos dos espaços e a circulação no espaço da cidade, mesmo que de forma temporária, é resultado de estratégias e ações conflituosas e envolve diferentes indivíduos e redes de interesse que dão sentido e organicidade ao espaço pelo qual circulam ou ocupam. Segundo Fortuna “a cidade é a imagem alegórica da sociedade” e, como tal, um espaço privilegiado da experiência dinâmica, complexa e difusa da vida social na contemporaneidade.
A hipótese geral que orienta o trabalho é a de que o lugar onde se localiza a Catedral da cidade de Aracaju é apropriada pelo universo “marginal” como um emblema simbólico-espacial. De forma específica, a importância simbólica desse espaço para a estética underground, se deve ao seu passado, uma vez que o referido espaço sempre serviu de palco da boemia aracajuana; enquanto que sua importância espacial se deve a sua localização, situada no centro, o que possibilita uma maior trânsito, facilitando o acesso a outros locais de convivialidade tais como bares de funcionamento 24h, galerias e mercado central , assim como, pelos equipamentos ofertados (bares, barracas de lanche, vendas de artesanato).
O ponto de partida de minha pesquisa foi, portanto, a escadaria da Catedral, por ser também um ponto de partida desses indivíduos para ação e significação coletiva de outros espaços (outras praças, galeria de arte do Yazige, o SINDIPETRO, a SOMESE), que não geram necessariamente um vínculo, uma identificação, ou seja, estes espaços são apropriados esporadicamente e momentaneamente (um vernissage, um show), como possibilidades adicionais de lazer: comida e bebida free, sociabilidades, bate-papo, diversão, reivindicação.
A proposta metodológica é, deste modo, a “caminhada” junto ao cotidiano do grupo escolhido, uma etnografia participante. De Certeau, usa como metáfora deste tipo de trabalho de campo na/da cidade, a idéia de se tornar um, andar e “viver” as práticas, táticas ou estratégias desses “homens ordinários”. Correr os riscos da noite e suas glórias, ou revive-las, tem se mostrado mais eficaz do que ser um “voyeur” desse cotidiano. A observação participante (caminhada pelo cotidiano social da cidade de Aracaju) tem como intuito a coleta de dados a partir da vivência do grupo. Essa interação com esses indivíduos, o viver suas práticas, possibilita observar a atuação destes perante as mais diversas situações e espacialidades.
Compõe a amostra desse grupo sete indivíduos, os mais freqüentes e talvez por esse motivo os mais reconhecidos como “verdadeiros undergrounds” na cena que estou recortando. Com uma faixa etária compreendida dos 21 aos 35 anos, uma predominância do gênero masculino (apenas duas mulheres), esse grupo amostra trás como forte característica, quiçá a que mais diferencie dos demais grupos em disputa por uma identidade underground, a marcação e valorização das diferenças individuais (idéias e valores). Não significa dizer que seja possível encontrar homogeneidade em outros grupos, apenas que nessa tribo as diferenças ganham maior visibilidade, sendo mais valorizada entre eles do que uma suposta igualdade.
A etnografia de rua (ROCHA; ECKERT, s/n), o olhar de perto e de dentro (MAGNANI, 2002), o ser um andarilho na cidade (DE CERTEAU, 2005) foram estratégias adotadas no desenvolvimento da presente pesquisa. O que consistiu em freqüentar, de junho até a presente data, o centro da cidade de Aracaju, em especial o Parque Teófilo Dantas, onde se situa a Catedral Metropolitana do Estado, sempre no período noturno.
O primeiro capítulo, Espaços Urbanas: o caráter espacializado das relações sociais na contemporaneidade. Volta-se ao estudo da sociologia e antropologia do espaço urbano, na construção dos saberes sobre as cidades e estilos de vida urbano. O desafio é relacionar a vasta produção sobre as cidades e seus espaço, com a discussão de estilos de vida. Assim como, traçar os trajetos dos personagens da noite aracajuana no centro histórico da cidade, no intuito de entender suas lógicas de mobilidade espacial.
O segundo capítulo, Identificação e negociações identitárias: construído um Estilo de Vida Underground vem como um suporte para a definição da escolha dos conceitos que melhor poderão caracterizar o objeto pesquisado. Propõe-se uma discussão a respeito de Identidades e Identificação, Solidariedade e Sociabilidade, Espaço e Lugar. O objetivo é perceber como são construídas diariamente as retóricas de identificação e como essas são influenciadas (ou influenciam) o uso dos espaços. Pretendo explorar no capítulo como os grupos, a partir do escolhido, se apropriam do espaço urbano atribuindo-lhe sentido de pertença e identificação, mesmo que esse sentido seja passageiro.
O terceiro e último capítulo, Caminhantes Noturnos: uma etnografia das práticas ordinárias, como sugere o próprio título, terá um cunho etnográfico. Acreditando ser capaz de propiciar um olhar de perto e de dentro (Magnani, 2000). A escolha desse método se justifica pela possibilidade deste propiciar ao pesquisador uma melhor visibilidade de determinados aspectos da dinâmica cotidiana do grupo que em geral passam despercebidas. Esse contato contínuo possibilitará uma melhor visualização da interação desses freqüentadores com o espaço urbano e com outros grupos, assim como, as lógicas de solidariedade e identificação estruturantes para esses freqüentadores da Praça da Catedral Metropolitana de Aracaju.

Referências Bibliográficas:

ALMEIDA, Maria Isabel M. Noites Nômades: espaço e subjetividade nas culturas jovens contemporâneas. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.
DE CERTEAU, Michel. A Invenção do Cotidiano. Petrópolis/RJ: Vozes, 1994 V. I.
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