Das mudanças das metáforas, às novas metáforas e mudanças na
teoria critica dos nossos tempos. É nesse empreendimento que Stuart
Hall elabora uma analise das representações metafóricas das
transformações culturais (e de certa forma, uma homenagem a Allon
White). Para tanto, se vale da obra que este elabora com Peter
Stallbryass: Política e a poética da transgressão.
Sugere Stuart Hall uma analise das “metáforas de transformação”
para pensar analiticamente a relação entre o social e o simbólico
no processo de transformação. Cita Marx e sua perspectiva de
reduzir as idéias operantes em toda sociedade, às idéias da classe
dominante (p. 206). Nessa direção a transformação corresponde à
substituição. Ou seja, “o mundo de cabeça para baixo”, a
metáfora que exprime inversão.
Essa concepção é superada, tendo a idéia de que as categorias
“alto” e “baixo” propostas por Allon Mhite e Peter
Stallbryass, que entendem, em uma perspectiva “carnavalesca” a
relação do social com o simbólico. Nesse sentido Hall sugere se
ater nas “afinidades eletivas” dos autores com as idéias
bakhtinianas.
Em suma trata-se de perceber as interligações hierárquicas no
campo do social e simbólico, que elaboram e reelaboram arcabouços
culturais que se relacionam. Essa inter-relação entre as classes
sociais sugere outras possibilidades de entender a “transgressão”.
O carnaval é a metáfora do “mundo as avessas”, onde o plebeu se
torna príncipe; o escravo manda no senhor; onde o corpo torna-se o
algoz subversivo.
A ênfase apresentada por Hall, e o que insiste em chamar atenção
por via da metáfora do carnaval é uma “interdependência”, onde
nenhuma forma ou idéia é hegemônica, ao passo que um se constrói
na relação com o outro. A hierarquia torna-se, assim, um espaço de
negociação e contradição.
Como fica assim a transgressão? Enquanto categoria de analise de
metáforas, se constitui em “... algo sintomático de uma transição
maior em nossa vida política e cultural, bem como no trabalho
teórico das últimas décadas.” (p.212). Demonstra essa
constatação por via dos Estudos Culturais.
Partindo de Raymond Williams chama atenção para o “popular”
como elemento transgressor das “fronteiras da classificação
cultural” (p. 213). Essa é a fonte do dilema binário. O
“relacionamente”.
Chegando a 1975 trata da 2ª fase do “Centro”: as “subculturas
jovens”. Nessa o caráter da “resistência” se caracteriza
enquanto frente à “ordem dominante”. A representação simbólica
é visualizada por via de “rituais”. Expressões diferentes – e
pouco entendidas – dos cânones clássicos de transformação
sócia. A base dessa postura é a idéia de “equilíbrio nas
relações de força” proposta por Gramsci na analise da luta
hegemônica. Substituindo a analise das relações sociais que
entende a “luta de classes”, essa por sua vez não foge do
esquema binário em dilema.
No terceiro momento apresenta a questão do “discurso ideológico”
sugerindo repensar conceitos, mecanismos e mapeamentos. É com esse
esforço que Hall entende que o caráter interdisciplinar – segundo
Schulman (1999:169): “Os Estudos Culturais foram concebidos desde o
inicio, como empreendimento interdisciplinar.” - dos Estudos
Culturais possibilita ampliar o olhar acerca do fenômeno da
ideologia para além de um marxismo recorrente.
A continuidade é a tentativa de aproximar a ideologia ao simbólico.
Colocando o significado assim como flutuante e não como
estabelecido, tendo em vista que o “signo ideológico” é
“plurivalente” (Volochinov apud Hall 2009:216). Dentre outras
concepções de relacional o ideológico ao signo (Freud).
Percebe-se ainda assim, que a idéia de classes não é abandonada.
Seja em lados opostos ou se relacionando de formas diferentes, mas
existem. Mas não seria possível pensar ideologia sem classes? Ou
ela só se funda nessa distinção, dicotomia...?
Essas reflexões que partem do texto têm a apresentação analítica
que Hall faz de Marxismo e filosofia da linguagem como
impulso. E nesta obra destaco quando o(s) autor(es)1
afirma(m) categoricamente: “Todo fenômeno que funciona como signo
ideológico tem uma encarnação material, seja como som, como massa
física, como cor, como movimento do corpo ou como outra coisa
qualquer.” (Bakhtin, Volochinov: 1990:33).
Hall segue apresentando a influencia de Bakhtin nos Estudos
Culturais. Entendo como afirma Schulman que posição teórica dos
estudiosos dos EC desde os princípios, se explica e se afirma pela
sua posição social. Logo, o fato de politicamente o contexto
influenciar Bakhtin, suas reflexões mostram uma perspectiva
dialógica na vida do autor. O dialogismo presente em sua obra põe
em debate a questão da autoria, o que também pode ser compreendida
na direção das representações.
E dessa reflexão acerca das metáforas de transgressão que Hall
considera fortuita a relação analítica entre a “dialógica da
plurivalência” e a “dialética do antagonismo de classe”. A
tentativa é mostrar a contribuição que uma lógica atribui à
outra, é como se uma preenchesse a lacuna - limite? - da outra
(p.220). Para tanto argumenta com Gramsci partindo dos “fundamentos
paradoxais que captam o relacionamento dialógico entre forças
antagônicas...” (p.221). Consiste num aprimoramento teórico
presente nos Estudos Culturais.
O conteúdo crítico de Stallybrass e White, na direção das
estruturas “binárias-e-inversões das metáforas clássicas”,
pode ser vista em McCabe, também recorrendo a Gramsci, quando se
volta para a cultura popular com base no “nacional popular”,
entendida como uma força de ruptura com o alto e baixo. A
horizontalidade proposta leva as metáforas na direção de não
considerar a cultura popular uma mera forma de resistência.
Dessa forma - dialogando com Derridá - isso não significa o
abandono da posição clássica, mas “colocá-la ´sob rasura`”.
É sim considerá-la fundamental na constituição de identidades
dentro da cultura européia (Stallybrass e White). Ressaltando assim
o “princípio hierárquico da cultura”, no procedimento de
deslocamento.
Por fim apresenta uma longa citação dos autores onde estes se valem
de Jameson para defender a dialética que forma o inconsciente
político quando procura alcançar a singularidade da identidade, e
nessa busca, o inconsciente torna-se heterogêneo.
BAKHTIN,
Mikhail (Volochinov). Marxismo e filosófica da linguagem. São
Paulo: HUCITEC, 1981.
HALL,
Stuart. Para Allon White: metáforas de transformação. HALL,
Stuart. Da Diáspora. Identidades e Mediações
Culturais. Beljo Horizonte: Ed UFMG/Humanitas,, 2009.
SHULMAN,
Norma. O Centre for Contemporary Cultural Studiesda
Univrsidade de Birmingham: uma historia intelectual. SILVA, Tomaz
Tadeu da (org.) O que é, afinal, Estudos Culturais? Belo
Horizonte: Autêntica, 1999.
1
Sem querer entrar no debate sobre autoria - mas é difícil definir
entre Volochinov e Bakhtin - como alerta Roman Jacobson no Prefácio
da obra; bem como Hall (2009:218). Vou usar os dois.
Texto de Wellington Bomfim