Por Danielle de Noronha
GEERTZ, Clifford.
Los usos de la diversidad.
Barcelona: Paidós, 1996, pp. 65 – 92.
No texto “Os usos da
diversidade”, Clifford Geertz reflete sobre o “futuro do
etnocentrismo” e, ao mesmo tempo, sobre o papel do antropólogo
nesta questão e sobre os usos e o estudo da diversidade. O ponto de
partida é a suposta suavização da diversidade cultural, que dá
lugar a um mundo formado por uma “variedade com espectro mais
pálido e estreito”, marcado apenas de pequenas e sutis diferenças.
Geertz inicia seu
pensamento a partir de um argumento de Claude Lévi-Strauss,
desenvolvido no trabalho “Um Olhar Distanciado” (Le regard
éloigné) do antropólogo francês. Em resumo, o argumento de
Lévi-Strauss, que foi apresentado durante uma conferência da UNESCO
de inauguração do “Ano internacional de luta contra o racismo e a
discriminação racial”, em 1971, defende o etnocentrismo
(utilizando outros termos) como uma ferramenta normal de manutenção
das diferenças sociais. Tal raciocínio compreende que determinada
cultura se perceba superior às demais e justifica que não seja
possível enxergar em outra cultura considerada diferente – e,
neste caso, inferior – algo que possa ser útil ou interessante
para si própria. Nesse sentido, se naturaliza a diferença entre
“nós” (somos quem somos) e “eles” (são quem são), e também
o racismo, e coloca barreiras definidas entre as diferentes culturas.
Assim, cada pessoa está presa a sua própria tradição cultural e
só pode enxergar o outro – e a si próprio – desde esta
perspectiva.
Geertz acredita que esse
pensamento tem dominado os estudos sobre a diversidade cultural,
mesmo que com diferentes abordagens, e que ele acaba apoiando-se na
ideia de que a diversidade cultural fornece alternativas a nós em
contraste com alternativas para nós. Isso é, outras crenças e
estilos de vida poderiam ser adotados por nós apenas se houvéssemos
nascido em outro contexto.
Porém, para Geertz, a
questão da diversidade cultural deve ser compreendida de outro modo
para englobar toda a complexidade que permeia o tema. Em primeiro
lugar, para o antropólogo, o consenso universal para questões
fundamentais não está próximo. Diferentes culturas e formas de ver
o mundo são responsáveis por diferentes opiniões sobre assuntos
comuns e isto provavelmente não mudará. Em segundo lugar, por mais
que Geertz esteja de acordo de que somos influenciados pelo “nosso”
lugar para compreender a nós mesmos e o mundo que nos rodea, ele
acredita que o problema do etnocentrismo está em nos impedir de descobrir
em que tipo de ângulo nos situamos em relação ao mundo, isto é,
nos impede de ampliar a nossa visão e saber quem realmente somos.
O antropólogo pondera
que as articulações do mundo social não estão divididas entre um
nós perspícuo, com o qual temos empatia mesmo com as diferenças
entre nós, e um eles enigmático, com o qual não temos empatia, por
mais que finjamos que reconhecemos o direito à diferença. A
sugestão de Geertz é que o sentido seja entendido como socialmente
construído. O etnocentrismo obscurece as lacunas e assimetrias entre
as pessoas e impossibilita que possamos mudar de ideia. Entretanto, a
história de todos os povos está relacionada com a possibilidade de
mudar de ideia, que também ocorre no encontro entre as diferentes
culturas. Entender a diversidade hoje é saber que vivemos um
processo de embaralhamento entre as culturas, em que as questões
morais e éticas provenientes da diferença estão também dentro de
“nós”. Para isso, ao invés de colocar fronteiras entre as
diferenças, é necessário apreender o que significa estar no outro
e, desta forma, no seu, para assim compreender como é possível
contornar uma assimetria moral autêntica, sem necessariamente
recorrer ao uso da força, isto é, daquele que possui mais poder. É
necessário aceitar e buscar uma incursão imaginativa na mentalidade
alheia.
O etnógrafo, segundo
Geertz, é o principal conhecedor da mentalidade do outro em nossa
sociedade e a etnografia é a grande inimiga do etnocentrismo. Ela
coloca nós e eles num mesmo espaço, que de alguma forma já é
comum, e não nos separa em diferentes planetas culturais. Para ele,
o trabalho da etnografia é proporcionar narrativas e enredos para
redirecionar nossa atenção, que nos tornem visíveis para nós
mesmos, como parte de um mundo onde existem outros e também
estranhezas com as quais teremos que aprender a lidar. E respeitar.
As diferenças podem ter
fronteiras definidas, mas estão em espaços sociais irregulares.
Geertz sugere que devemos pensar a diferença de um modo
diferente, em que as distintas culturas possam ser
entendidas como parte de uma grande colagem de diferenças
justapostas. E, para isso, devemos fortalecer a nossa capacidade de
imaginação e aprender a apreender o que não podemos abraçar.
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