Foto: Frank Marcon
Mateus
Antonio de Almeida Neto
Ana
Júlia Sateles Vieira
Gabriela Losekan
Letícia Oliveira Galvão
O ano de 2020 tem sido abalado mundialmente pelo coronavírus (COVID-19),
desde os primeiros casos na China. A diminuta transparência das políticas
governamentais, em nível mundial, tornou tal situação uma pandemia, caso de atenção pública mundial. A Organização Mundial da Saúde (OMS), entre outras
entidades associadas a saúde pública, secretários e ministros da saúde de várias
nações têm aconselhado sobre medidas para prevenção e combate, entre elas, o
isolamento social, quarentena para os infectados, o uso contínuo de água, sabão
e álcool em gel 70% para lavar as mãos, distanciamento de 2m entre pessoas, entre outras, como o fechamento de áreas comerciais e serviços com
possibilidade de aglomeração. No Brasil, o governo federal liderado pelo
presidente da república, Jair Messias Bolsonaro, junto com vários empresários
do setor das indústrias, comércio e serviços, têm se pronunciado contra a
medida de isolamento social, que deve abalar a estrutura econômica e a política
nacional. Os governadores têm destacado que preferem ficar ao lado da ciência.
Em Sergipe, o decreto do governo do Estado nº 40.567, de 24 de março,
destaca que, apenas serviços alimentícios com entrega delivery, estabelecimentos voltados a saúde à nível de emergência e
urgência, setores de abastecimento e alimentos, podem funcionar, desde que
utilizem as medidas preventivas. Dessa forma, bares, restaurantes e casas de
espetáculos passaram a ser fechados, atingindo aos artistas em geral,
principalmente aos jovens das periferias e os que vivem da economia informal
ligado a este segmento. Vários são os músicos que têm se manifestado pelas
redes sociais digitais, principalmente utilizando aplicativos de comunicação
com acesso a plataformas de streaming,
que com o uso de um celular com câmera de vídeo e áudio conectados à internet,
transmitem seus shows de suas residências e estúdios, a exemplo das lives no Instagram. Neste espaço
virtual, os artistas têm solicitado entre os seus seguidores, contribuição
financeira, a exemplo de jovens artistas do samba, que vivem do estilo de música
e dança associado ao gênero. Este texto tem como objetivo fomentar o debate
sobre os estilos de vida distintivos das juventudes e suas expressões
associadas a uma dita autonomia social e financeira.
A pandemia advinda pelo COVID-19 tem contribuído para reflexões não
somente sobre a crise econômica que a acompanha, mas, também, sobre aspectos
sociais que a mesma carrega. Enaltecida por alguns canais jornalísticos como “a
crise que definirá a nossa geração” (CHADE, 2020), o isolamento social como
ferramenta de prevenção obriga a repensar prioridades, assim como enxergar as
distintas realidades sociais que configuram o Brasil. A falta de uma liderança
que oriente a população durante esse período de incertezas e a discrepância de
informações a que se tem acesso, fazem questionar quais serão os impactos do COVID-19
e do isolamento social, não só à sociabilidade, como, também, às projeções de
futuro dessa geração de jovens nativos da revolução digital e filhos da crise
ambiental em todos os seus aspectos.
Como destaca Rodrigues (1992), as cidades, o processo de urbanização, a
implementação de tecnologias digitais, bem com o embelezamento estratégico de
certas áreas urbanas, a estruturou em eixos: habitação (tanto para as classes
ditas populares quanto para à média e a classe alta); comércio varejista e
atacado; industrial; setores vinculados a saúde, entre outros. A cidade
tornou-se o espaço privilegiado do consumo, provocando significativas
alterações em seus consumidores, a exemplo das juventudes enquanto símbolo de
renovação das sociedades contemporâneas (FEATHERSTONE, 1995). Os bens materiais
e sua produção, a troca e o consumo são características do hipercapitalismo -
criativo, transestético -, que resulta do processo de autoreprodução e
transformação de mercadorias num signo, no qual o significado é determinado de
forma arbitraria diante de um sistema de autoreferenciamento de significantes
(FEATHERSTONE, 1995).
É neste mundo que as juventudes nascidas a partir da revolução
tecnológica digital dos anos 1990, tem produzido uma nova forma de ser, sentir,
experienciar e estar jovem distinta das gerações precedentes (FEIXA; NOFRE,
2012). Assim, no contexto das sociedades contemporâneas e das megalópoles,
estilos de vida são um dos componentes da forma cultural urbana e exigem “uma
construção a partir do consumo de bens, de modo individual, com maiores
preocupações de referências do que de pertenças, de identificações e não tanto
de identidade” (RODRIGUES, 1992, p.103).
Partindo desse ponto, é possível levantar novamente parte da discussão
acima sobre as manifestações virtuais de jovens artistas durante a crise do
COVID-19. Sendo obrigados a seguir orientações contrárias aos estímulos do
“estar-junto” suscitados pela vida urbana (MAFFESOLI, 1998), esses jovens ainda
manifestam, contudo, o que se entende por uma coletividade expressa, dessa vez,
virtualmente - a exemplo das lives e
outras formas de reunir-se online em
tempos de isolamento. É possível pensar, então, como um “ethos centrado na proximidade” (MAFFESOLI, 1998) pode se configurar
de maneira distinta nos tempos atuais.
Desde o pós-Segunda Guerra Mundial, as juventudes passaram a ser
tematizadas, nas Ciências Sociais, por transpor barreiras socioculturais,
políticas, econômicas e afetivas diferentes do universo denominado adulto, seja
na forma de se relacionar uns com os outros, em grupos demarcados por gostos,
aparência física, lazer, indumentárias e até relações voltadas para uma
distinção de classe e gênero, entre outras formas distintivas (CLARKE, 2014).
Tal aspecto, formou toda uma indústria cultural e de massa que estetizou formas
estilísticas do universo juvenil dos trabalhadores associado ao lazer e
proporcionou uma economia dos símbolos, um caldeirão de enunciados, identidades
múltiplas, cambiantes e relacionais, ou seja, estilos de vida que passaram a
fazer parte de uma cultura juvenil e geracional ancorados em objetos-símbolos
(FEIXA; NOFRE, 2012; CLARKE, 2014; MURDOCK, 2014).
Lá se vão algumas décadas e muitas distintas formas de vivenciar o fenômeno das culturas juvenis. Nestes tempos de pandemia, as juventudes associadas a estilos de vida ligados as artes e a cultura, somadas às suas habilidades digitais, por mais afetadas que estejam sob o aspecto econômico dos efeitos do isolamento, têm dado uma resposta bastante significativa a sociedade,
ao publicar em suas redes sociais digitais a identificação com o contexto
global e local sobre o isolamento social, enfatizando o “fique em casa”. Além do mais, as redes sociais
digitais, a exemplo do Twitter, do Instagram e do Facebook têm possibilitado as juventudes formas alternativas de “estar-junto” experimentando a sensação de pertencimento à uma comunidade
global, mesmo diante de suas diferentes preferências, interesses e gostos, das suas diferentes formas de entender o mundo ou de suas formas de identificação pessoal e coletivas. Os modos de aproximação e de identificação social a partir do consumo estarão em plena transformação daqui para frente e necessitaremos recolocar algumas discussões sobre sociabilidades e sobre as identidades afetivas, sociais e políticas.
Referências
CHADE, Jamil. Coronavírus: a crise que definirá
a nossa geração. EL PAÍS, 2020.
Disponível em:
https://brasil.elpais.com/opiniao/2020-03-17/a-crise-que-definira-nossa-geracao.html?ssm=FB_CC&fbclid=IwAR3rJYaXRRqVnVrOwsNr2wMN-tLeVujknW38PlLFkdz64RE3v1fCsT5SdXs.
Acesso em: 30/03/2020.
CLARKE, John. Estilo. In: HALL, Stuart; Jefferson , Tony (Eds.). Rituales de resistencia:
subcultruas juveniles en la Gran Bretaña de postguerra. Primeira edición de Traficantes de Sueños. Traducción: A. Nicolás
Miranda; Rodrigo O. Ottonello; Fernando Palazzolo. Madrid: Gráfica Lizara,
2014.
FEATHERSTONE, Mike. Cultura de consumo e
desordem global. In: Cultura de Consumo e
Pós-modernismo. São Paulo, Studio Nobel, 1995.
FEATHERSTONE, Mike. Culturas da cidade e estilos
de vida pós-modernos. In: Cultura de
Consumo e Pós-modernismo. São Paulo, Studio Nobel, 1995.
FEATHERSTONE, Mike. Estilo de vida e cultura de
consumo. In: Cultura de Consumo e
Pós-modernismo. São Paulo, Studio Nobel, 1995.
FEIXA, Carles; NOFRE, Jordi. Youth Cultures. Sociopedia.isa, 2012.
Georg Simmel. A filosofia do dinheiro (1900/1907). Tradução de Antonio C. Santos.
Frankfurt/M, Suhrkamp, 1989.
MAFFESOLI, Michel. O tempo das tribos: o declínio do individualismo nas sociedades de
massa. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998.
MURDOCK, Graham; MCGRON, Robin. Conciencia de
clase y conciencia de generación. In: HALL, Stuart; Jefferson, Tony (Eds.). Rituales de resistencia: subcultruas
juveniles en la Gran Bretaña de postguerra. Primeira edición de Traficantes
de Sueños. Traducción: A. Nicolás Miranda; Rodrigo O. Ottonello; Fernando
Palazzolo. Madrid: Gráfica Lizara, 2014.
RODRIGUES, Walter. Urbanidade e novos estilos de
vida. Sociologia – Problemas e
Práticas, nº 12, pp. 91-107, 1992.
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