Por Raiane Santos
O sociólogo e filósofo
alemão, Axel Honneth (1949), ao vislumbrar a teoria do reconhecimento a partir
das discussões já antecipadas na filosofia de Hegel, compreende que tal teoria
é baseada em três fases: no amor, no direito e na estima. O autor entende que a
primeira fase do reconhecimento, acentuada pelas relações afetivas e pelo amor,
deve ser considerada sobretudo a partir das relações primárias, “na medida em
que elas consistam em ligações emotivas fortes entre poucas pessoas [...] e de
relações pais/filhos”. (p.159). Esta fase do reconhecimento pautada nos afetos,
acaba sendo objeto de estudos também no campo da psicanálise, mostrando,
inclusive, que a relação mãe-filho quando passa por um rompimento simbiótico
ainda na primeira infância, pode gerar distúrbios no comportamento do bebê,
isso porque “a interação entre mãe e criança se efetua como um processo
altamente complexo, no qual ambos os implicados se exercitam mutuamente na
capacidade de vivenciar em comum sentimentos e percepções”. (HONNETH, 2009,
p.162).
No que diz respeito à
segunda fase do reconhecimento, sendo o direito, Honneth (2009, p.193), afirma
que “um sujeito é respeitado e encontra reconhecimento jurídico não só na
capacidade abstrata de poder orientar-se por normas morais, mas também na
propriedade concreta de merecer o nível de vida necessário para isso”. Por
último, a terceira fase do reconhecimento - baseada na estima - demonstra que
os sujeitos operam diante de um processo de solidariedade, onde as relações
sociais são estabelecidas de forma simétrica. Esta última fase funciona como
uma consequência da segunda, ou seja, para que o sujeito consiga se enxergar de
forma valorativa em meio a sociedade, é indispensável que o mesmo se reconheça
enquanto sujeito de direitos.
As três fases do
reconhecimento ao serem associadas ao contexto do acolhimento institucional,
nos levam a pensar que as trajetórias de vida dos jovens que já passaram e que
ainda se encontram em instituições de acolhimento são atravessadas por três
segmentos: o rompimento do laço afetivo/parental; a luta para que sejam vistos
como sujeitos de direitos e o autorreconhecimento permeado pela estima social a
partir dos valores aspirados comunitariamente, ou seja, nos espaços de
acolhimento institucional.
A socióloga Lia
Pappámikail, em seu artigo intitulado Juventude(s),
autonomia e Sociologia: questionando conceitos a partir do debate acerca das
transições para a vida adulta, menciona que diante dos vários sentidos
associados à juventude, ainda é permanente a ideia de que “o jovem é alguém
inacabado, em processo de construção ou em devir. Este fato imprime a esta fase
de vida um incontornável caráter transitório e ambíguo que tornou desde sempre,
a sua análise conceitualmente complexa (...)”. (PAPPÁMIKAIL, 2010, p.399).
A discussão levantada
pela socióloga aponta para vários temas que emergem nos debates a respeito das
juventudes, mas um dos fatores que ganha foco e que podemos associar aos
debates que envolvem as dimensões do reconhecimento é o processo de transição
que ocorre entre as categorias jovem e adulto. Quando Pappámikail coloca que o
jovem é um sujeito em processo de construção, refere-se também a condição de
construir uma determinada identidade, construção esta que acaba passando, em
determinada fase, pelo processo de se reconhecer e ser reconhecido em ou a
partir de algo. Pensar o processo de transição entre etapas da vida implica em
diversos arranjos, seja a partir do matrimônio, inserção no mercado de
trabalho, independência financeira, entre outros aspectos e categorias. Nesse
sentido, a reflexão que é posta em pauta coloca em questão como jovens que
utilizam os serviços de acolhimento institucional se reconhecem enquanto
sujeitos e de que modo o ato de reconhecer-se implica na maneira como enxergam
as etapas de transição ao longo de suas trajetórias?
Referências:
HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos
conflitos sociais. Tradução de Luiz Repa. São Paulo: Editora 34, 2009.
PAPPÁMIKAIL, Lia. Juventude(s), autonomia e Sociologia:
questionando conceitos a partir do debate acerca das transições para a vida
adulta. Sociologia: Revista do Departamento de Sociologia da FLUP, Vol. XX,
2010, pág. 395-410.
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